Por Andrea Chiarelli e Rob Johnson
Atualmente, estima-se que algo entre um terço e metade dos artigos de periódicos tenha versões abertas disponíveis logo após a publicação. No entanto, as versões abertas costumam ser compartilhadas através de canais (por exemplo, repositórios, servidores de preprints) que são desconectados da página do periódico onde um artigo de acesso pago (paywalled) normalmente residiria. Este é um obstáculo considerável para os leitores, já que as versões abertas da literatura científica correm o risco de definhar em lugares desconhecidos, em vez de estar disponíveis à vista de todos para ser encontradas.
O objetivo do acesso aberto (AA), e a justificativa para o investimento significativo neste modelo de negócios, é permitir que versões abertas da literatura científica sejam encontradas, reutilizadas e tenham um impacto além do que seria o caso se tivessem o acesso restrito por pagamento. Assim, a descoberta de AA é uma prioridade para as comunidades de pesquisa do Reino Unido e internacionais. Uma vez que o panorama de descoberta de AA está apinhado, os produtos de descoberta de AA competem por espaço e eficácia contra a infraestrutura pública estabelecida, os serviços de descoberta de bibliotecas e os serviços comerciais. Finalmente, o acesso ilegal à literatura acadêmica via Sci-Hub aparenta estar tirando a atenção das ferramentas de descoberta de AA, pois uma ampla variedade de usuários finais de pesquisa relatam estar usando esta via ao invés de buscar o acesso através de caminhos legais.
Diversas ferramentas de descoberta de AA estão atualmente disponíveis e as próprias bibliotecas e pesquisadores estão tomando decisões importantes sobre como se envolver e usar estes produtos. Neste contexto, o Jisc pediu à Research Consulting para preparar esta revisão para ajudar na compreensão do tema e apoiar seus membros.
Por que as ferramentas de descoberta de AA são importantes?
Descobrir artigos acadêmicos gratuitos é frequentemente difícil, pois não há um único lugar onde eles possam ser encontrados. Do ponto de vista de um leitor navegando na web em busca de artigos para ler, as ferramentas de descoberta de AA são mais relevantes em um cenário específico – imagine que você esteja visitando uma página web de um periódico e encontre um artigo que deseja ler:
- Se for AA, você realmente não precisará de ferramentas de descoberta de AA para fazer buscas, pois o artigo estará imediatamente disponível para navegação e, provavelmente, para download.
- Se não for AA, no entanto, as ferramentas de descoberta de AA se tornam relevantes: encontrar se e onde existe uma versão aberta é um desafio real! Por exemplo, possíveis respostas podem estar em repositórios institucionais (AA Via Verde) ou servidores de preprints.
As ferramentas de descoberta de AA tendem a operar de maneira semelhante. Primeiro, um usuário instala a extensão do navegador da ferramenta. Então, quando a extensão detecta um DOI enquanto o usuário navega na Internet, este é usado para executar uma pesquisa através de:
- A base de dados da própria ferramenta, se houver alguma disponível; e
- Uma gama de bases de dados externas, incluindo, por exemplo. O PMC (PubMed Central), o CORE (COnnecting REpositories) – um serviço financiado pelo Jisc, o BASE (Bielefeld Academic Search Engine) ou a base de dados de uma outra ferramenta (por exemplo, o conjunto de dados do Unpaywall).
Se uma cópia em AA for encontrada, a extensão do navegador normalmente exibirá um ícone na janela do navegador para levar o usuário à cópia aberta do artigo.
Atualmente, duas ferramentas principais estão disponíveis para obter o que foi mencionado acima: Unpaywall e OA Button. Estes se concentram apenas na descoberta da AA e existem há alguns anos. Outra ferramenta que oferece uma extensão de navegador e recursos de descoberta de AA é o Kopernio; no entanto, este foi projetado para ajudar os leitores com assinaturas institucionais, em vez de se concentrar principalmente no caso de uso discutido acima. O cenário de descoberta de AA como um todo também inclui uma variedade de outros players que não oferecem extensões de navegador, mas indexam material AA (exclusivamente ou além da literatura paga) que é então pesquisável em seus sites. Os exemplos incluem o 1findr, o Dimensions, o Google Scholar e o CORE, gerenciado pelo Jisc/Open University. Serviços adicionais para bibliotecas e publishers também estão disponíveis, como o Anywhere Access, que simplifica os fluxos de trabalho para que os usuários finais acessem conteúdo em AA por meio de bibliotecas institucionais e sites de publishers.
No contexto de nosso trabalho, falamos com vários interessados em todo o cenário de descoberta de AA – uma das principais observações levantadas foi que “por enquanto, estas ferramentas são soluções alternativas tentando consertar um sistema corrompido”. Isso se refere à transição (lenta) para o AA: quanto mais artigos se tornarem AA nas plataformas dos publishers no futuro, menos extensões do navegador de descoberta de AA precisarão ser usadas para localizar cópias gratuitas para leitura. No entanto, neste estágio, é difícil prever quanto tempo a transição esperada pode demorar e, portanto, as ferramentas de descoberta de AA provavelmente atendem a uma necessidade de médio prazo, pelo menos. Eles devem, no entanto, evoluir com o mercado e diversificar suas operações até certo ponto: como exemplo, notamos que o Unpaywall recebeu um auxílio à pesquisa do Fundo Arcadia, que está sendo usado para apoiar o desenvolvimento de uma ferramenta com tecnologia de tornar a pesquisa compreensível para usuários em potencial além do meio acadêmico.
O interesse de bibliotecas acadêmicas está crescendo
Os fornecedores de sistemas de bibliotecas têm investido substancialmente em ferramentas para descobrir literatura, incluindo a chamada descoberta em escala web, cujos exemplos principais são o EBSCO Discovery, o Proquest Summon®, o ExLibris Primo e o WorldCat® Discovery. Estes serviços estão instalados coletivamente em quase 10.000 sites de clientes. Cada vez mais, as ferramentas de descoberta de AA estão sendo integradas aos sistemas de bibliotecas e aos “resolvedores” de links (link resolvers), bem como às bases de dados tradicionais de resumo e indexação (por exemplo, o Scopus, o Web of Science).
Alguns exemplos de esforços para integrar a descoberta de AA em sistemas de bibliotecas incluem:
- A Kopernio anunciou uma colaboração com o Instituto de Tecnologia da Califórnia (Caltech), com o objetivo de oferecer acesso com um clique ao conteúdo de assinatura e de acesso aberto.
- O OA Button recebeu um auxílio à pesquisa do Fundo Arcadia para trabalhar na melhoria dos empréstimos entre bibliotecas através dos seus produtos GetPDF e InstantILL.
- O CORE recentemente estabeleceu uma parceria com a ProQuest para fornecer mais conteúdo em seus serviços de descoberta de bibliotecas (Ex Libris Primo e Ex Libris Summon).
- O Dimensions da Digital Science e o serviço 1findr da 1Science (agora propriedade da Elsevier) visam combinar funções de análise e descoberta em escala web em um único produto.
A questão da legitimidade no panorama da descoberta de AA
O “elefante na sala” quando se trata de descoberta de AA é a dificuldade em identificar resultados legítimos ao usar as extensões do navegador de descoberta de AA: quando uma ferramenta de descoberta de AA apresenta ao usuário uma versão de leitura livre, é muito complexo verificar sua proveniência e saber se o artigo foi compartilhado legalmente, antes de mais nada.
A maioria das ferramentas parece estar fazendo esforços neste sentido, particularmente ao não incluir o ResearchGate entre suas fontes. Esta rede de colaboração acadêmica é conhecida por hospedar um grande número de artigos científicos em versões que violam direitos autorais e violam as políticas dos publishers: portanto, o uso do ResearchGate como fonte de dados em ferramentas de descoberta de AA pode levar a versões ilegais de AA.
Neste ponto, parece haver concordância em torno do fato de que nenhuma ferramenta é capaz de garantir que 100% do conteúdo seja compartilhado legitimamente. Esta continua sendo uma importante área de foco para todas as ferramentas de descoberta de AA, porém, nossos entrevistados enfatizaram que isso é mais percebido por bibliotecários, que precisam recomendar fontes legítimas de literatura científica, do que por usuários finais que apenas tentam acessar uma publicação de interesse. No entanto, o tópico é relevante para um público muito mais amplo, incluindo publishers, financiadores de pesquisa, administradores de universidades e muito mais.
Preenchendo seletivamente a lacuna dos metadados para possibilitar uma melhor descoberta de AA
Melhores metadados no panorama da comunicação científica são desejáveis por si só, mas não são a solução para todos os problemas técnicos de descoberta de AA.
Seria desejável ter mais metadados interoperáveis (incluindo licenciamento) em repositórios institucionais (AA Via Verde) e servidores de preprints, pois estes são alguns dos locais onde o conteúdo de AA é mais provável de ser encontrado quando o artigo original é de acesso pago. Metadados aprimorados e mais interoperáveis nestes locais poderiam reduzir os esforços que as ferramentas de descoberta de AA precisam fazer para manter suas próprias bases de dados (Unpaywall, em particular) e rastrear a Internet para obter cópias gratuitas de publicações de acesso pago. Além disso, contribuiria para abordar a questão da legitimidade, fornecendo evidências sólidas de que a pesquisa depositada em repositórios institucionais e servidores de preprints é devidamente licenciada para compartilhamento.
Uma questão aberta na área de descoberta de AA é qual proporção da literatura acadêmica total está disponível em alguma versão aberta. Neste caso, o Crossref seria um ponto de partida sólido: os metadados de licenciamento aprimorados no Crossref seriam úteis para mostrar uma imagem mais clara do cenário do AA, mas não seriam particularmente úteis para um usuário final que já estivesse em uma página da Web do periódico, tentando ler o resultado de uma pesquisa.
O futuro das ferramentas de descoberta de AA
As ferramentas de descoberta de AA executam uma tarefa relativamente simples, que corresponde a um DOI ou título/outra consulta a uma URL de AA. No entanto, o esforço para corresponder precisamente DOIs/consultas a URLs de AA não é insignificante: as ferramentas de descoberta de AA devem ter uma alta taxa de recuperação (ou seja, quantos DOIs/consultas têm uma correspondente URL de AA), mas também necessitam precisão (ou seja, a URL de AA resultante deve corresponder ao DOI/ à busca). Se correspondências errôneas estiverem presentes na base de dados, a confiança do usuário diminuirá: isso leva algumas das ferramentas a realizar verificações manuais dos links entre DOIs e URLs de AA para garantir que a precisão seja a mais alta possível.
Sob a suposição de que uma base de dados confiável e precisa está disponível para correspondência de DOIs/ títulos /outras consultas a URLs de AA, o esforço computacional para conectar o primeiro ao último é relativamente baixo. Da mesma forma, os algoritmos necessários para isso também são simples e uma tarefa mais exigente seria desenvolver uma extensão de navegador e uma interface de usuário fáceis de usar.
Para melhorar a descoberta de AA, a comunidade de comunicação científica terá que se concentrar nos metadados. Esperamos que melhorias nos metadados do lado de repositórios institucionais e servidores de preprints sejam as mais eficazes para suportar ferramentas de descoberta de AA, mas os publishers também podem oferecer suporte à descoberta de AA fornecendo informação de licenciamento mais completas e consistentes ao enviar registros ao Crossref. A função dos identificadores persistentes (DOIs em particular) também não deve ser subestimada: a maioria das ferramentas de descoberta de AA faz a correspondência entre DOI e URL de AA em suas bases de dados, por isso é essencial atribuí-las a todos os resultados de pesquisa considerados dentro do escopo de descoberta de AA.
Nossa análise mostra que o panorama de descoberta de AA está repleto de soluções interessantes e de rápido crescimento. Devido ao nível de experimentação na área e às contínuas mudanças no panorama do acesso aberto, é difícil dizer se uma ou mais ferramentas prevalecerão. Talvez os usuários possam se aglutinar em torno de um ou de um pequeno número de ferramentas líderes em tempo, mas isso dependerá de vários fatores, incluindo desempenho, mas também confiança e sustentabilidade financeira.
O papel do Jisc e de outros atores na área, incluindo universidades, bibliotecas e publishers, é preciso: os usuários finais precisarão de orientação e aconselhamento para navegar neste ambiente complexo e entender qual abordagem de descoberta de AA melhor atende às suas necessidades e práticas cotidianas. No entanto, uma questão permanece: como a descoberta de AA (uma questão amplamente técnica) pode ser ainda mais integrada em fluxos de trabalho existentes para permitir uma experiência de usuário mais tranquila?
Referências
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Clarivate Analytics and Caltech Collaborate to Offer Researchers One-Click Access to Published Research [online]. Clarivate Analytics blog, 2018 [viewed 17 May 2019]. Available from: https://clarivate.com/blog/news/clarivate-analytics-caltech-collaborate-offer-researchers-one-click-access-published-research/
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The STM Report [online]. International Association of STM Publishers. 2018 [viewed 17 May 2019]. Available from: https://www.stm-assoc.org/2018_10_04_STM_Report_2018.pdf
Links externos
1findr <https://www.1science.com/1findr/>
Anywhere Access <https://www.anywhereaccess.com/>
BASE (Bielefeld Academic Search Engine) <https://www.base-search.net/>
CORE – Aggregating the world’s open access research papers <https://core.ac.uk/>
Database Snapshot | Unpaywall<https://unpaywall.org/products/snapshot>
Dimensions <https://www.dimensions.ai/>
EBSCO Discovery Service <https://www.ebscohost.com/discovery>
ExLibris Primo <https://www.exlibrisgroup.com/products/primo-library-discovery/>
Google Scholar <https://scholar.google.co.uk/>
Kopernio <https://kopernio.com/>
Open Access Button <https://openaccessbutton.org/>
PMC <https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/>
Research Consulting <https://www.research-consulting.com/>
The Summon® Service <https://www.proquest.com/products-services/The-Summon-Service.html>
WorldCat® Discovery <https://www.oclc.org/en/worldcat-discovery.html>
Sobre os autores
Andrea Chiarelli (Consultor) e Rob Johnson (Diretor) trabalham na Research Consulting. A Research Consulting é uma empresa de consultoria ativa com sede no Reino Unido no cenário do ensino superior e que apoia a JISC em uma série de projetos em comunicação científica, ciência aberta, dados de pesquisa e muito mais.
Artigo original em inglês
Traduzido do original em inglês por Lilian Nassi-Calò
Como citar este post [ISO 690/2010]:
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