preLights: servidor de preprints de biologia conta com revisão de jovens pesquisadores do mundo todo

Por Jordan F. Sampar e Lilian N. Calò

Logo do preLights

A cena que abre o conhecidíssimo filme 2001: Uma Odisseia no Espaço Stanley Kubrick, de 1968, projeta um homem pré-histórico explorando a ossada de um animal morto, já completamente decomposto. O primeiro tateia o esqueleto do segundo e… ali há uma nova descoberta! Encontra-se um osso e, a partir dele, designa-se uma função secundária, além da biológica.

 

 

Embora haja o subjetivismo de significado, a cena de 2001 demonstra de forma evidente a recepção de uma nova informação, o contato com um conteúdo anteriormente desconhecido, a identificação de suas propriedades, o caminho percorrido até aquela descoberta, a avaliação do que é feito a partir destes novos achados e, também, a designação de uma nova função.

Poderíamos continuar a descrever a cena do antológico filme de Kubrick, mas, também, é possível traçar paralelos da projeção cinematográfica de 1968 para a contemporaneidade, sobretudo quando pensamos na produção e veiculação de preprints para a comunidade acadêmica.

Preprints são manuscritos depositados em acesso aberto em um repositório ou servidor de preprints, antes da avaliação por pares. Os autores utilizam este recurso antes de submeter o manuscrito a um periódico ou de forma simultânea à submissão, para que os resultados sejam imediatamente compartilhados com a comunidade científica. Preprints podem ser citados (dispõem de DOI) e a despeito de não ser arbitrados antes da publicação, podem receber comentários, que funcionam como avaliação por pares pós-publicação.

Os comentários, na maior parte das vezes, são considerados pelos autores para fazer alterações no manuscrito e finalmente submetê-los a um periódico, e ao processo tradicional de peer review. Estimativas mostram que 70% dos preprints no bioRxiv, servidor de preprints de ciências biológicas, são publicados em periódicos até dois anos após a postagem inicial no servidor e 38% destes preprints recebem ao menos um comentário.

Na medida que aumenta a produção de preprints e considerando sua relevância e interesse na comunidade científica, a demanda por identificar e selecionar potenciais revisores para comentar os preprints se torna mais relevante. Neste sentido, a The Company of Biologists, em parceria com a comunidade de ciências biológicas, estabeleceu em 2018 uma plataforma formada por jovens pesquisadores para avaliarem preprints. Esta foi a gênese do preLights.

A equipe de cientistas (denominados “preLighters”) é constituída por estudantes de doutorado (48%), pós-doutorado (46%) e pesquisador principal (principal investigator, PI) e/ou outras posições (6%). Sua missão é selecionar, destacar e comentar preprints que lhes são particularmente interessantes e que apresentam impactos para a comunidade biológica. Majoritariamente, os preprints são selecionados de plataformas como bioRxiv seguindo o critério temporal de três meses, máximo, da publicação.

Extraído, o preprint é comentado pelo pesquisador em uma publicação autoral feita em um site hospedado pela The Company of Biologist. Em sua publicação, o autor preLighter resume o preprint escolhido, elenca os pontos altos dos resultados, a contribuição destes para a sua (ou do grupo que pertence) linha de pesquisa e abre para questionamentos aos autores originais, que podem ser respondidos nos comentários e, posteriormente, vinculados à publicação do preprint no site do preLights.

O servidor de preprints preLights é uma iniciativa comunitária apoiada pela The Company of Biologists, publisher sem fins lucrativos dedicada a apoiar e inspirar a comunidade de ciências biológicas. As formas na qual a comunidade realiza suas atividades é por meio de publicações, eventos e bolsas de estudo de pós-graduação, além de oferecer suporte adicional à comunidade, fomentando reuniões científicas, fornecendo bolsas para participação em eventos a pesquisadores e apoiando sociedades científicas.

A empresa é administrada por cientistas renomados e atuantes e os lucros são revertidos para a ciência e não aos acionistas. Assim, o publisher inspira novas ideias e apoia a comunidade de biólogos. De forma complementar, a The Company of Biologists edita cinco periódicos especializados e arbitrados: Development, Journal of Cell Science, Journal of Experimental Biology, Disease Models & Mechanisms e Biology Open.

Entre as vantagens de fazer parte da equipe destaca-se o incentivo a novos pensamentos e abordagens metodológicas científicas que podem ser aplicáveis à pesquisa desenvolvida pelos preLights, além de colocar em contato pesquisadores da comunidade e autores dos preprints, promovendo colaborações científicas entre grupos de pesquisa, ampla divulgação em redes sociais e o diálogo fundamental para continuar alicerçando a importância da revisão por pares.

No filme de Kubrick, o homem pré-histórico bate o osso — a sua nova descoberta — contra o esqueleto do animal até destrui-lo, reduzindo-o a fragmentos. Semelhante é a lapidação de um preprint para a validação de uma nova descoberta e/ou contribuição a uma determinada área. Em uma espécie de comemoração e demarcação da evolução temporal, o homem lança o osso para cima, que gira e a cena corta para um satélite espacial. Na contemporaneidade, a união de esforços consegue entender, descrever e abrir questionamentos sobre áreas distintas para que, através do diálogo, nós também possamos chegar lá.

Links externos

2001: A Space Odyssey – Wikipedia

bioRxiv

preLights

The Company of Biologists

 

Sobre Jordan F. SamparFotografia de Jordan F. Sampar

Jordan F. Sampar é Bacharel em Ciências Biomédicas e Mestre em Neurofisiologia pela Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da Universidade de São Paulo (USP). Atualmente é doutorando na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Tem conhecimento nas áreas de Biologia do Desenvolvimento, Embriologia, Neurofisiologia e Neurodesenvolvimento. Possui, ainda, dois livros publicados e atua fortemente na interface entre ciência, educação, dados e sociedade.

 

Sobre Lilian Nassi-Calò

Lilian Nassi-Calò é química pelo Instituto de Química da USP e doutora em Bioquímica pela mesma instituição, a seguir foi bolsista da Fundação Alexander von Humboldt em Wuerzburg, Alemanha. Após concluir seus estudos, foi docente e pesquisadora no IQ-USP. Trabalhou na iniciativa privada como química industrial e atualmente é Coordenadora de Comunicação Científica na BIREME/OPAS/OMS e colaboradora do SciELO.

 

Como citar este post [ISO 690/2010]:

SAMPAR, J.F. and NASSI-CALÒ, L. preLights: servidor de preprints de biologia conta com revisão de jovens pesquisadores do mundo todo [online]. SciELO em Perspectiva, 2025 [viewed ]. Available from: https://blog.scielo.org/blog/2025/09/10/prelights-servidor-de-preprints-de-biologia/

 

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