Por Jan Velterop
Em posts anteriores1,2, mencionei e comentei sobre o Plano S. Em setembro de 2018, imediatamente após o Plano S ter sido apresentado, Tim Vines publicou um post no The Scholarly Kitchen3 no qual ele argumenta que o Plano S, baseado em financiamento de acesso aberto com taxas de processamento de artigo (article processing charges, APCs) deveria ser descartado e o AA deveria ser financiado por taxas de submissão. Ele chamou sua ideia de Plano T (imagino que seja porque T segue S no alfabeto). É uma ideia antiga, porém válida. Eu sou há muito tempo a favor de taxas de submissão. Afinal, ter um artigo revisado e aceito em um periódico é como fazer um exame; para obter uma carteira de motorista, por exemplo. É preciso pagar por tal exame, quer seja aprovado ou não. Tim Vines usa o exemplo de um exame dentário em seu post. Você não paga apenas se o dentista encontrar uma cárie para preencher ou um dente para extrair.
Para os publishers, a mudança para um modelo de negócios baseado em taxa de submissão traz consigo uma desvantagem significativa de pioneirismo. Lembro-me do fenômeno nas décadas de 1960 e 1970 de autores abandonando periódicos dirigidos por sociedades e migrando para periódicos comerciais, em parte devido ao fato que as sociedades cobravam por página (page charge) e periódicos comerciais apresentavam aos pesquisadores opções gratuitas de publicação (para os autores, isto é). Tim Vines parece bastante otimista referente ao seu Plano T ter uma boa chance de sucesso, já que espera que “ter taxas de submissão pagas diretamente pelos financiadores também diminuiria significativamente o ‘efeito pioneiro’ e, convenientemente, o pagamento direto das taxas de publicação já é parte do Plano S.”3
Eu sou menos otimista. Não porque eu acredite que os financiadores se recusariam a pagar a conta, mas por outro motivo: o que uma taxa de submissão faria seria obrigar um publisher a garantir a realização de uma avaliação por pares adequada e justificar verdadeiramente qualquer rejeição. Isso é algo que muitos publishers não fariam – possivelmente não poderiam fazer – ou se sentiriam muito desconfortáveis em fazê-lo.
Então, vamos para a próxima letra do alfabeto: Plano U. No mesmo dia em que o post de Tim Vines foi publicado, Richard Sever (da Cold Spring Harbor Publishers e do bioRxiv) reagiu disparando um tweet que dizia: “Plano U: basta impor através de mandato a deposição de preprints e permitir que um ecossistema de sobreposições/periódicos siga rio abaixo com vários modelos de negócios, e evolua em resposta às necessidades da comunidade. Benefício colateral: acelerar a ciência massivamente…”4
Agora falamos a mesma língua. Isso está inteiramente de acordo com o que eu propus em 2015 [em um post]5. Inicialmente, o Plano U apareceu em um site, o planu.org, que era anônimo, sem data, e não existe mais. No entanto, em 4 de junho de 2019, um artigo formal intitulado “Plan U: Universal access to scientific and medical research via funder preprint mandates” (Plano U: acesso universal à pesquisa científica e médica via mandatos de preprints de financiadores)6 apareceu no periódico PLOS Biology. Não há razão alguma para que este Plano U não decole, embora inicialmente possa ser lento, dada à inércia usual da comunidade científica em geral.
O Plano U oferece à comunicação científica tudo o que ela precisa. Compartilhamento rápido de resultados de pesquisa via preprints, sem o custo por vezes alto de APCs; opções de avaliação por pares e publicação formal em periódicos posteriormente. E este último, que pode ser caro, somente se e quando necessário para financiamento ou projeção na carreira. Pode até mesmo tornar as diferenças entre acesso aberto e periódicos por assinatura bastante irrelevantes para a divulgação dos resultados da pesquisa, uma vez que a versão em acesso aberto de cada artigo será de qualquer forma garantida através do preprint.
Notas
1. VELTEROP, J. Plano S — e Taxas de Processamento de Artigo (APCs) [online]. SciELO em Perspectiva, 2018 [viewed 19 June 2019]. Available from: https://blog.scielo.org/blog/2018/11/27/plano-s-e-taxas-de-processamento-de-artigo-apcs
2. VELTEROP, J. É iminente um dramático impulso ao acesso aberto? Acredito que sim! [online]. SciELO em Perspectiva, 2019 [viewed 19 June 2019]. Available from: https://blog.scielo.org/blog/2019/02/13/e-iminente-um-dramatico-impulso-ao-acesso-aberto-acredito-que-sim/
3. VINES, T. Plan T: Scrap APCs and Fund Open Access with Submission Fees [online]. The Scholarly Kitchen, 2018 [viewed 19 June 2019]. Available from: https://scholarlykitchen.sspnet.org/2018/09/20/plan-t-scrap-apcs-and-fund-open-access-with-submission-fees/
4. SEVER, R. [social network]. In: @cshperspectives [online]. Twitter, September 20, 2018 [viewed 19 June 2019]. Available from: https://twitter.com/cshperspectives/status/1042721777540100096
5. VELTEROP, J. Ciência (que deve ser comunicada) em primeiro lugar, carreiras (que demandam seletividade) depois [online]. SciELO em Perspectiva, 2015 [viewed 19 June 2019]. Available from: https://blog.scielo.org/blog/2015/10/29/ciencia-que-deve-ser-comunicada-em-primeiro-lugar-carreiras-que-demandam-seletividade-depois/
6. SEVER, R., EISEN, M. and INGLIS, J. Plan U: Universal access to scientific and medical research via funder preprint mandates. PLOS Biology [online]. 2019, vol. 17, no.6, e3000273 [viewed 19 June 2019]. DOI: 10.1371/journal.pbio.3000273. Available from: https://journals.plos.org/plosbiology/article?id=10.1371/journal.pbio.3000273
Referências
POYNDER, R. The Open Access Interviews: Jan Velterop [online]. Open and Shut?, 2012 [viewed 19 June 2019]. Available from: https://poynder.blogspot.com/2012/02/open-access-interviews-jan-velterop.html
SEVER, R. [social network]. In: @cshperspectives [online]. Twitter, September 20, 2018 [viewed 19 June 2019]. Available from: https://twitter.com/cshperspectives/status/1042721777540100096
SEVER, R., EISEN, M. and INGLIS, J. Plan U: Universal access to scientific and medical research via funder preprint mandates. PLOS Biology [online]. 2019, vol. 17, no.6, e3000273 [viewed 19 June 2019]. DOI: 10.1371/journal.pbio.3000273. Available from: https://journals.plos.org/plosbiology/article?id=10.1371/journal.pbio.3000273
VELTEROP, J. Ciência (que deve ser comunicada) em primeiro lugar, carreiras (que demandam seletividade) depois [online]. SciELO em Perspectiva, 2015 [viewed 19 June 2019]. Available from: https://blog.scielo.org/blog/2015/10/29/ciencia-que-deve-ser-comunicada-em-primeiro-lugar-carreiras-que-demandam-seletividade-depois/
VELTEROP, J. É iminente um dramático impulso ao acesso aberto? Acredito que sim! [online]. SciELO em Perspectiva, 2019 [viewed 19 June 2019]. Available from: https://blog.scielo.org/blog/2019/02/13/e-iminente-um-dramatico-impulso-ao-acesso-aberto-acredito-que-sim/
VELTEROP, J. Plano S — e Taxas de Processamento de Artigo (APCs) [online]. SciELO em Perspectiva, 2018 [viewed 19 June 2019]. Available from: https://blog.scielo.org/blog/2018/11/27/plano-s-e-taxas-de-processamento-de-artigo-apcs
VINES, T. Plan T: Scrap APCs and Fund Open Access with Submission Fees [online]. The Scholarly Kitchen, 2018 [viewed 19 June 2019]. Available from: https://scholarlykitchen.sspnet.org/2018/09/20/plan-t-scrap-apcs-and-fund-open-access-with-submission-fees/
Link externo
Plan S and cOAlition S <https://www.coalition-s.org/>
Sobre Jan Velterop
Jan Velterop (1949), geofísico marinho, tornou-se editor científico em meados dos anos 1970. Ele iniciou sua carreira como editor na Elsevier em Amsterdã. Em 1990 tornou-se diretor de um jornal holandês, mas retornou à publicação científica internacional em 1993 na Academic Press em Londres, onde desenvolveu o primeiro acordo nacional que permitiu acesso eletrônico a todos os periódicos AP por todas as instituições de ensino superior do Reino Unido (o que mais tarde foi denominado BigDeal). Ele foi Diretor na Nature, mas logo se dedicou para ajudar a fazer decolar o BioMed Central. Ele participou da Iniciativa de Budapeste para o Acesso Aberto. Em 2005 foi para a Springer, baseado no Reino Unido como Diretor de Acesso Aberto. Em 2008 ele deixa a Springer para apoiar o desenvolvimento de abordagens semânticas para acelerar descobertas científicas. Velterop é um ativo defensor do acesso aberto em conformidade com a Iniciativa de Acesso Aberto de Budapeste (BOAI) e do uso de microatribuições, a referência das denominadas “nanopublicações”. Ele publicou vários artigos sobre ambos os temas.
Traduzido do original em inglês por Lilian Nassi-Calò.
Como citar este post [ISO 690/2010]:
Leia comentário em inglês, por Jeroen Bosman:
https://blog.scielo.org/en/2019/06/19/open-access-plans-s-t-u-so-far/#comment-158138