O papel da contribuição não-brasileira no desempenho dos periódicos de psicologia no Brasil

Por Chris Fradkin

Em 2017, foi publicado no periódico Paidéia (Ribeirão Preto) um artigo intitulado “A Internacionalização dos Periódicos de Psicologia no Brasil: Uma Análise Bibliométrica Baseada em Quatro Índices”1. O artigo provocou discussão e debate dentro da área. Houve pedidos de informação; para investigação adicional; para exame de outros índices. Esta resposta levou a um estudo recém-lançado, intitulado “The Impact of Non-Brazilian Contribution on the Publishing Performance of Psychology Journals in Brazil2. Embora o estudo original1 tenha focado principalmente nos índices propostos pelo Rogerio Meneghini do SciELO, o presente estudo2 explora variáveis mais substanciais, com foco na contribuição não-brasileira.

O estudo2 consiste em uma análise bibliométrica da literatura internacional e na colaboração e o desempenho da publicação entre os maiores periódicos de psicologia do Brasil. O desempenho da publicação foi operacionalizado pelo publisher do periódico: maior quartil (n = 2) para periódicos publicados por publishers internacionais; e menor quartil (n = 16) para periódicos publicados no Brasil. Os 746 artigos incluídos no estudo foram codificados por tipo de estudo, colaboração internacional e contribuição não-brasileira. Os testes de qui-quadrado e teste exato de Fisher foram conduzidos para estimar diferenças entre os grupos com maior e pior desempenho. Desde a concepção do estudo, foi dada a ênfase à língua franca (autores de língua nativa inglesa) versus a contribuição Ibero-Americana.

Os resultados revelaram que a colaboração e contribuição de autores de língua inglesa foi mais prevalente entre os periódicos de melhor desempenho; enquanto a contribuição de autores Ibero-Americanos não-brasileiros foi mais prevalente entre os periódicos de baixo desempenho. Mais específico foi o achado de que a contribuição da língua franca não-brasileira estava associada a um maior desempenho de periódicos/publicações. Estes achados são consistentes com o estudo de 2017, que encontrou maior prevalência de artigos com autores principais de língua franca entre os periódicos de melhor desempenho.

Quando agregamos os resultados de ambos os artigos2, percebemos que os periódicos de melhor desempenho têm taxas mais altas de:

  • Textos em inglês;
  • Contribuição em língua franca;
  • Colaboração em língua franca;
  • Membros do conselho editorial da língua franca; e
  • Artigos empíricos.

Também observamos que os periódicos com melhor desempenho têm taxas mais baixas de:

  • Contribuição brasileira não-colaborativa; e
  • Contribuição Ibero-Americana não-brasileira.

A implicação é que o desempenho de publicação está fortemente vinculado à contribuição não-brasileira.

Na superfície, parece que, entre os periódicos de psicologia no Brasil, a contribuição da língua franca e a contribuição Ibero-Americana podem ser mutuamente exclusivas. Esta inferência seria enganosa, no entanto. Seria mais sensato inferir que a presença do input da língua franca, em vez da ausência de insumos Ibero-Americanos, é o combustível que impulsiona os periódicos de maior desempenho. Essa inferência, no entanto, nos leva a controvérsias. “Mas e a nossa cultura?”, alguns cientistas dirão. “Como brasileiros, devemos escrever em português.” “É a hegemonia da língua inglesa”, alguns filósofos dirão. “Isso desvaloriza a ciência não-língua franca!”

Embora estas afirmações possam ter mérito próprio, coletivamente, elas não percebem a visão mais abrangente. Mas eles erram ao ignorar que o inglês é a língua da ciência. O inglês é a língua franca. Rogerio Meneghini e Abel Packer, do SciELO, dizem que, para um acadêmico publicar no mercado global, ele deve ter um domínio mínimo do inglês. Assim, a declaração anterior deve ser revisada. A versão atualizada diz: O desempenho da publicação está fortemente vinculado à contribuição da língua franca não-brasileira.

Isso nos leva à noção da “ciência perdida”, um termo cunhado por Wayt Gibbs em 1995. A ciência perdida refere-se à produção científica não acessada das nações “emergentes” ou “em desenvolvimento”. Uma das principais razões para esta inacessibilidade é o idioma. Para o acadêmico das nações emergentes se comunicar em inglês, isso requer imersão na língua franca. Através de minha experiência no Brasil, como bolsista da Fulbright em 2017-2018 e tempo que passei aqui antes disso, os acadêmicos mais dinâmicos, criativos e bem-sucedidos que conheci passaram bastante tempo imersos na língua franca. Para a maioria deles, essas imersões aconteceram na forma de programas de pós-graduação e pós-doutorado: um mínimo de vários anos no exterior em instituições de língua inglesa. Por necessidade, esses acadêmicos obtiveram proficiência em inglês bem acima de suas contrapartes brasileiras.

Hoje em dia, quando falo com estudantes de pós-graduação e acadêmicos iniciantes, eles inevitavelmente me pedem conselhos. Para todos eles, minha resposta é a mesma: “Passe algum tempo em um país de língua inglesa”.

Os resultados deste estudo apresentam um plano para um subconjunto de periódicos. Este subconjunto inclui periódicos que: (1) publicam conteúdo de natureza global (vs. regional); (2) contam com pessoal administrativo confortável com o idioma inglês; e (3) têm afinidade natural pela publicação em língua franca. Da mesma forma como um sextante e uma bússola ajudam o marinheiro a manter o rumo, as descobertas deste estudo podem orientar o editor e o publisher que desejam alcançar o mercado global.

Os resultados também são relevantes para os formuladores de políticas, particularmente aqueles envolvidos nos rankings do Qualis. Para eles, a mensagem diz: “para melhor classificar os periódicos brasileiros, seus critérios devem reconhecer contribuições não-brasileiras”. Embora as implicações do estudo2 variem de micro a macro, como todos os estudos, ele tem suas limitações.

Uma limitação do estudo2 é seu desenho transversal: é uma amostra periódicos no período de um ano. Como tal, devemos nos abster de projetar resultados para o futuro. Devemos também abster-nos de inferências de direcionalidade. Por exemplo: devemos assumir que os autores não-brasileiros enviaram seus artigos para os periódicos brasileiros de maior nível devido à qualidade e ao status dos periódicos? Ou deveríamos supor que a publicação de manuscritos não-brasileiros aumentou a qualidade e o status do periódico? O pensador crítico responderia: “Depende”.

Ao discutir a internacionalização, devemos ter em mente que os periódicos científicos do Brasil não foram concebidos para distribuição global. Na maior parte, eram vozes dos departamentos de pós-graduação e apresentavam trabalhos de cientistas e acadêmicos locais. Como tal, este trabalho era mais brasileiro do que global em sua natureza. Nos últimos anos, no entanto, houve uma mudança entre alguns periódicos para ampliar seu escopo de disseminação. É para periódicos desse tipo que os achados deste estudo são direcionados.

Para ler o artigo, acesse

FRADKIN, C. The Impact of Non-Brazilian Contribution on the Publishing Performance of Psychology Journals in Brazil. Frontiers in Psychology [online]. 2018, vol. 6, no. 1934, pp. 1-9, ISSN 1664-1078 [viewed 3 December 2018]. DOI: 10.3389/fpsyg.2018.01934. Available from: https://www.frontiersin.org/articles/10.3389/fpsyg.2018.01934/full

Notas

1. FRADKIN, C. The Internationalization of Psychology Journals in Brazil: A Bibliometric Examination Based on Four Indices. Paidéia (Ribeirão Preto) [online]. 2017, vol. 27, no. 66, pp. 7-15, ISSN 0103-863X [viewed 00 December 2018]. DOI: 10.1590/1982-43272766201702. Available from: http://ref.scielo.org/xnr3sb

2. FRADKIN, C. The Impact of Non-Brazilian Contribution on the Publishing Performance of Psychology Journals in Brazil. Frontiers in Psychology [online]. 2018, vol. 6, no. 1934, pp. 1-9, ISSN 1664-1078 [viewed 3 December 2018]. DOI: 10.3389/fpsyg.2018.01934. Available from: https://www.frontiersin.org/articles/10.3389/fpsyg.2018.01934/full

3. Veja a Tabela 6 de FRADKIN (2018) para ver os resultados agregados.

Referências

FRADKIN, C. The Impact of Non-Brazilian Contribution on the Publishing Performance of Psychology Journals in Brazil. Frontiers in Psychology [online]. 2018, vol. 6, no. 1934, pp. 1-9, ISSN 1664-1078 [viewed 3 December 2018]. DOI: 10.3389/fpsyg.2018.01934. Available from: https://www.frontiersin.org/articles/10.3389/fpsyg.2018.01934/full

FRADKIN, C. The Internationalization of Psychology Journals in Brazil: A Bibliometric Examination Based on Four Indices. Paidéia (Ribeirão Preto) [online]. 2017, vol. 27, no. 66, pp. 7-15, ISSN 0103-863X [viewed 00 December 2018]. DOI: 10.1590/1982-43272766201702. Available from: http://ref.scielo.org/xnr3sb

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NASSI-CALÒ, L. Internacionalização como indicador de desempenho de periódicos do Brasil: o caso da psicologia [online]. SciELO em Perspectiva, 2017 [viewed 3 December 2018]. Available from: https://blog.scielo.org/blog/2017/03/14/internacionalizacao-como-indicador-de-desempenho-de-periodicos-do-brasil-o-caso-da-psicologia/

 

Sobre Chris Fradkin

Chris Fradkin é um estudioso premiado da Fulbright, baseado no Rio de Janeiro. Ele possui doutorado em ciências psicológicas pela Universidade da Califórnia, Merced. Seus interesses de pesquisa vão desde a internacionalização de periódicos em países emergentes até a estruturação de resiliência em jovens vulneráveis. Suas publicações incluem artigos nos periódicos Health Psychology, Academic Pediatrics e Child Abuse & Neglect.

 

Traduzido do original em inglês por Lilian Nassi-Calò.

 

Como citar este post [ISO 690/2010]:

FRADKIN, C. O papel da contribuição não-brasileira no desempenho dos periódicos de psicologia no Brasil [online]. SciELO em Perspectiva, 2018 [viewed ]. Available from: https://blog.scielo.org/blog/2018/12/03/o-papel-da-contribuicao-nao-brasileira-no-desempenho-dos-periodicos-de-psicologia-no-brasil/

 

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