Abel L Packer, MCI. 2011-Presente, Diretor do Programa SciELO; 1999-2010, Diretor do Centro Latino-Americano de Informação em Ciências da Saúde/OPAS/OMS
Rogerio Meneghini, Doutor em Bioquímica, Pós-doutorado pela Stanford Universty. 1998- presente – Coordenador Científico do Programa SciELO; 1965-2004 Professor, Departamento de Bioquímica da Universidade de São Paulo
Cerca de duas décadas atrás, conferências e consultas organizadas pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) e o Centro Latino-Americano e do Caribe de Informações em Ciências da Saúde (BIREME/OPAS/OMS) constataram que apenas uma pequena fração de nossos periódicos revisados por pares editados nacionalmente, contendo ciência de classe internacional, eram indexados no ISI Citation Indexes ou no PubMed.
Naquela época, a publicação científica era efetivamente dividida em dois. Por um lado, havia os chamados periódicos mainstream, publicados em grande parte por editoras comerciais na Europa e os EUA. Operando em paralelo estavam editoras regionais, muitas vezes baseadas em países em desenvolvimento, que abordavam os mercados de língua não-inglêsa.
O artigo de 1995 “Lost Science in the Third World”1 de W. Wayt Gibbs no Scientific American, 273, 92-99, discutiu algumas das dificuldades enfrentadas pelos editores regionais. Por um lado, estávamos presos em um ciclo vicioso. Se a pesquisa regional relevante não fosse amplamente incluída em índices internacionais, seria menos provávelmente citada e, portanto, os periódicos não seriam elegíveis para inclusão nestes índices. Muitos, entretanto, na América Latina e no sul global, presumiam que um viés mais insidioso estava presente. Como sugeria o artigo da Scientific American, muitas pessoas achavam que os publishers de países de língua não-inglêsa e do mundo em desenvolvimento estavam sendo submetidos a padrões de inclusão mais rigorosos do que os publishers da América ou Europa
Como consequência, apenas uma parte limitada da melhor ciência publicada por periódicos editados nacionalmente chegaria a comunidade científica internacional. Além disso, a maioria dos periódicos que comunicavam pesquisa de escopo ou interesse local tinha visibilidade limitada, inclusive no Brasil, devido à limitada distribuição dos exemplares impressos.
O SciELO abordou esta situação como uma combinação de um índice de citação e editora on-line de acesso aberto de periódicos selecionados, muitos dos quais estavam disponíveis apenas em português. FAPESP e BIREME, como organizações líderes em suas áreas de especialização, criaram o SciELO há 18 anos com um modelo cooperativo único, que foi particularmente adequado a publicação acadêmica em mercados emergentes. SciELO apoia publishers regionais a se tornarem mais competitivos no mercado global, trabalhando em conjunto e compartilhando conhecimentos e recursos. Seu propósito foi, e ainda é, avançar tanto a comunicação científica como a ciência no Brasil.
O SciELO rapidamente emergiu tanto como uma plataforma de publicação que complementa os periódicos internacionais “main stream”, como um modelo cooperativo inovador para a publicação acadêmica. O valor desta abordagem foi posteriormente corroborada pela política de “regionalização” da WoS, que a partir de 2007, aumentou a cobertura dos periódicos do Brasil de 30 para mais de 130. O recente aumento de interesse no mercado Latino-Americano de publishers comerciais que buscam parcerias com publishers regionais é mais uma prova da eficácia da abordagem do SciELO para apoiar a indústria editorial local.
A Comisión Nacional de Investigación Científica y Tecnológica do Chile (CONICYT) adotou o modelo SciELO de publicação logo após o seu lançamento em 1998, tornando-se assim um dos principais parceiros na construção da rede, que agora engloba 14 países Ibero-Americanos e a África do Sul. A rede abrange atualmente mais de mil periódicos ativos com um acervo de mais de meio milhão de artigos em texto completo. A plataforma provê diariamente em média mais de um milhão de downloads compatíveis ao COUNTER, fazendo do SciELO um contribuidor significativo da comunicação científica global.
SciELO tem conseguido, em grande medida, superar a discriminação contra a “publicação regional”. A abordagem cooperativa em rede, combinada com a melhoria contínua da produção dos periódicos, mantendo os custos bem gerenciados, tem contribuído decisivamente para a globalização da indexação e publicação. O SciELO também enriquece cultural e academicamente o fluxo global de informação científica por reconhecer e valorizar o papel crítico desempenhado por centenas de editores sem fins lucrativos dispersos que estão comunicando resultados de pesquisa através de uma miríade de periódicos que cobrem uma ampla gama de temas da importância internacional e regional.
Em comparação com a Web of Science (WoS) e Scopus, o SciELO se destaca como um índice e publisher multilingue, apoiando periódicos de todas as disciplinas. A seleção de periódicos é realizada por recomendações e conselhos dos comités científicos locais. Este processo de seleção única, primordialmente qualitativo, afeta a composição do índice. Por exemplo, o SciELO indexa relativamente mais periódicos de Ciências Sociais e Humanidades que a WoS ou Scopus. Em termos de idiomas, em 2014, cerca de 70% dos artigos indexados no SciELO foram publicados em português ou espanhol e 38% em inglês. Os publishers brasileiros de SciELO estão fazendo um enorme esforço no sentido de uma abordagem mais equilibrada ao multilinguismo para reforçar a internacionalização das seus periódicos: em 2014, 58% dos artigos foram publicados em português, 57% em inglês e 16% simultaneamente em inglês e português.
A presença do SciELO faz uma diferença significativa e positiva na forma como a comunidade de informação global pensa sobre o desenvolvimento futuro. Estamos conscientes de que ainda há muitos desafios a serem enfrentados, e velhas atitudes prejudiciais às comunidades locais de pesquisa que ainda devem ser superadas em alguns trimestres.
Nota
1 Lost Science in the Third World – http://www.nature.com/scientificamerican/journal/v273/n2/pdf/scientificamerican0895-92.pdf
Referência
GIBBS, W. W. Lost Science in the Third World. Scientific American. 1995, vol. 273, pp. 92-99. DOI: 10.1038/scientificamerican0895-92
Links externos
Centro Latino-Americano e do Caribe de Informações em Ciências da Saúde (BIREME/OPAS/OMS) – http://www.paho.org/bireme
Comisión Nacional de Investigación Científica y Tecnológica (CONICYT) – http://www.conicyt.cl/
Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) – http://www.fapesp.br/
Scopus – http://www.scopus.com/
Web of Science (WoS) – http://thomsonreuters.com/en/products-services/scholarly-scientific-research/scholarly-search-and-discovery/web-of-science.html
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