Por Solange Santos, Denise Peres Sales e Abel L Packer
O SciELO é o mais importante programa de Acesso Aberto (AA) entre os países em desenvolvimento e emergentes e um dos mais destacados mundialmente. A adoção pioneira do AA em 1998 sob a liderança da FAPESP, BIREME/OPAS/OMS e de periódicos de qualidade de sociedades e instituições acadêmicas é um marco no desenvolvimento da pesquisa e da comunicação científica do Brasil. O modelo SciELO foi adotado no mesmo ano pelo Chile e expandiu-se como rede de coleções de periódicos que cobre hoje 16 países, que, em conjunto, indexam cerca de 1000 periódicos e acumulam mais de 500 mil artigos em Acesso Aberto.
Desde então, a adoção e implantação do AA vem contribuindo de modo decisivo para aumentar a visibilidade dos periódicos do Brasil e dos demais países da Rede SciELO. A publicação em Acesso Aberto é parte integral dos princípios e objetivos do SciELO com vistas ao aperfeiçoamento continuado dos periódicos que indexa e do aumento sustentável do uso, influência e impacto das pesquisas que comunicam. O desenvolvimento do SciELO é atualmente orientado pelas linhas de ação de profissionalização, internacionalização e sustentabilidade financeira, que se refletem nos novos Critérios SciELO de indexação publicados em setembro de 2014.
A formalização do Acesso Aberto em nível de periódicos e de artigos é um dos critérios de indexação do SciELO. Ela é realizada por meio da adoção de atribuições de acesso do sistema Creative Commons (CC) que incentivam a reutilização e distribuição dos artigos indexados em suas coleções. A licença identificada como CC-BY é definida como a principal atribuição de AA pelos novos Critérios SciELO, em substituição à CC-BY-NC adotada anteriormente. Com esta decisão o SciELO alinha-se com os principais periódicos e publicadores internacionais de Acesso Aberto.
Assim, com o objetivo de avançar a implantação deste critério que visa maximizar o acesso e reutilização dos resultados de pesquisa, o SciELO Brasil passará a adotar como padrão a licença CC-BY a partir de 1º de julho de 2015. A perspectiva é que até o final de 2015 a licença CC-BY seja aplicada à maioria dos periódicos e artigos da Coleção SciELO Brasil. A partir de 2016 este padrão deverá ser adotado por todas as coleções da Rede SciELO.
As vantagens da licença CC-BY
As principais declarações de Acesso Aberto (Budapeste, Bethesda, Berlim e Salvador) enfatizam que o AA vai além de simplesmente propiciar acesso. O AA busca remover tanto as barreiras de acesso, quanto de reutilização dos conteúdos, e, desse modo, tem o potencial de transformá-los e formalizá-los como bens públicos de grande contribuição para o progresso da pesquisa, inovação, educação e políticas públicas informadas. Além do mais, o AA permite que todos os resultados de pesquisa estejam disponíveis para todos os cidadãos levando em consideração que grande parte das pesquisas são financiadas por recursos públicos.
Partindo dessa perspectiva, para que o Acesso Aberto atinja plenamente seu potencial, é necessário que as barreiras de reutilização dos conteúdos científicos sejam também removidas. Nesse sentido, as licenças CC são adotadas internacionalmente como a solução legal mais adequada para explicitar, promover e fomentar a reutilização dos resultados da pesquisa, permitindo também de forma categórica que o autor mantenha os direitos que considere conveniente. Desse modo, em vez de limitar-se à transferência dos direitos de uso exclusivo às editoras, atribui-se ao artigo uma licença aberta que estimula e facilita a sua reutilização e compartilhamento, aumentando, portanto, a sua visibilidade, uso, influência e impacto.
Os vários tipos de licenças CC concedem aos usuários distintos tipos de liberdades. Dentre todas as licenças, a CC-BY é a mais efetiva para maximizar a disseminação da informação, tendo em vista que, é a menos restritiva, proporciona maior grau de liberdade de reutilização dos conteúdos e, como as demais licenças, assegura que o crédito de autoria seja devidamente atribuído ao autor ou autores, ao periódico ou outro meio onde o artigo foi publicado originalmente. Isso faz com que a licença CC-BY seja a licença de maior compatibilidade quando combinada a outros tipos de licenças, ou seja, os conteúdos estão liberados para interoperar plenamente com os mais diferentes sistemas e serviços, incluindo os comerciais.
As demais licenças do sistema CC, que também são aceitas pelo SciELO como segundas opções, operam sob o lema “alguns direitos reservados” e são listadas a seguir na ordem da menos para a mais restritiva:
Compartilhamento pela mesma Licença – Share Alike (CC-BY-SA)
Mais restritiva que a CC-BY, esta licença permite que sejam criadas e distribuídas obras derivadas, inclusive para fins comerciais, contanto que o crédito seja atribuído ao autor e que as obras derivadas sejam licenciadas sob os mesmos termos. Desse modo, esse tipo de licença propaga a utilização continuada da licença original em seus derivados. Portanto, em comparação com a CC-BY essa licença apresenta desvantagens, pois coloca algumas limitações à reutilização, uma vez que, o conteúdo licenciado com o atributo Share-Alike, somente poderá ser combinado e redistribuído com outros conteúdos que adotem este mesmo atributo, ao passo que, a CC-BY pode ser combinada com qualquer conteúdo desde que os requisitos da licença CC-BY sejam respeitados.
Uso Não-Comercial (CC-BY-NC)
Esta licença permite que sejam adaptadas e criadas obras derivadas, sendo garantido o crédito ao autor e vedado o uso com fins comerciais. Era a principal licença adotada anteriormente pelos critérios SciELO Brasil de indexação.
É importante constatar que há certa dificuldade de se identificar claramente as fronteiras do que de fato constitui o uso comercial, tais como: reutilização de textos e imagens em tutoriais, apostilas e blogs; reutilização de dados, tabelas, imagens em manuais médicos e técnicos que são comercializados; uso dos conteúdos em portais e serviços de acesso à informação em universidades, outras instituições e empresas privadas com fins lucrativos; indexação de artigos em bases de dados comercializadas e repositórios, dentre outros. Desse modo, a licença CC-BY-NC não é capaz de impedir muitos tipos de reutilização dos conteúdos em contextos que envolvem vendas ou interesses comerciais, mas ao tentar restringir o uso comercial acaba gerando dúvidas sobre tipos e condições de uso, o que muitas vezes, desestimula a reutilização dos conteúdos. Essa dificuldade que apresenta a licença CC-BY-NC foi uma das razões que motivaram o Programa SciELO a adotar a CC-BY como licença principal. Com a adoção da licença CC-BY o SciELO poderá disseminar e interoperar plenamente os periódicos e artigos nos contextos comercial e não comerciais indistintamente.
Uso Não Comercial – Compartilhamento sob a mesma licença (CC-BY-NC-SA)
Esta licença permite que sejam adaptadas e criadas obras derivadas do original com fins não comerciais, desde que o crédito seja atribuído ao autor e a novas obras sejam licenciadas sob os mesmos termos. Assim, essa licença é ainda mais restritiva que a CC-BY-NC, pois além de vedar o uso comercial, a CC-BY-NC-SA propaga essa restrição para todas suas obras derivadas.
Desse modo, a propagação da não comercialização torna a CC-BY-NC-SA ainda mais desvantajosa que a CC-BY-NC porque, além da dúvida sobre o uso e reuso de conteúdos em contextos comerciais, ela passa a exigir que o meio e o contexto sejam também não comerciais.
Não a obras Derivadas (CC-BY-ND)
Esta licença permite a redistribuição e o uso para fins comerciais e não comerciais, contanto que a obra seja redistribuída na forma completa, sem modificações, e que os créditos sejam devidamente atribuídos ao autor.
Uso Não Comercial – Não a Obras derivadas (CC-BY-NC-ND).
Esta licença é a mais restritiva dentre as seis principais licenças do sistema Creative Commons. A licença CC-BY-NC-ND permite que seja feito o download e o compartilhamento da obra, exige que o crédito seja atribuído ao autor, mas não permite nenhum tipo de modificação nem utilização da obra ou partes dela para fins comerciais.
Organismos Internacionais e Agências Intergovernamentais (CC-[…] IGO)
Organismos internacionais e agências intergovernamentais adotam também o sistema de licenças CC com a qualificação IGO (Intergovernmental Organizations) como, por exemplo, CC-BY-IGO ou CC-BY-SA-IGO. Como estas organizações possuem privilégios e imunidades em relação às legislações nacionais, a qualificação IGO indica que disputas legais são resolvidas por meio de mediação ou arbitragem. Como o SciELO indexa e publica periódicos de organismos internacionais a licença padrão nestes casos é a CC-BY-IGO.
CC-BY é utilizada pelos principais periódicos de Acesso Aberto
Como apresentado, o sistema Creative Commons compreende licenças que combinam diferentes níveis de restrição de compartilhamento e reutilização dos conteúdos. Como também já mencionado, o SciELO em seus novos critérios de indexação definiu a CC-BY como a principal licença a ser utilizada com vistas a maximizar a presença e uso dos periódicos SciELO e das pesquisas que comunicam em todos os ambientes, comerciais ou não, que compõem o sistema internacional de comunicação científica.
Esse critério de indexação segue as políticas de Acesso Aberto dos principais publicadores e periódicos de AA como são o PLoS, eLife, Biomed Central, Hindawi, dentre outros, que adotam a licença CC-BY pelas vantagens de ampla disseminação que oferecem. O Bulletin of the World Health Organization adota o CC-BY-IGO. A Open Access Scholarly Publishers Association (OASPA) que reúne as principais editoras e sistemas de comunicação científica que adotam o Acesso Aberto recomenda decisivamente a adoção da licença CC-BY.
Distribuição atual das licenças CC-BY no SciELO Brasil
A Tabela abaixo apresenta a distribuição dos periódicos da coleção SciELO Brasil segundo licenças CC-BY adotada em 2014, com destaque para a atribuição CC-BY-NC definida como principal até 2013 pelos critérios de indexação e adotada por 80% dos periódicos. É importante observar também que 17% dos periódicos já adotam a licença CC-BY e apenas um número bem reduzido de 9 periódicos adotam a licença mais restritiva.
Licença Adotada em 2014 |
N. Títulos |
% de Títulos na Coleção SciELO Brasil |
Total de artigos |
% de artigos em SciELO Brasil |
CC-BY-NC |
229 |
79,8 |
247.788 |
86,2% |
CC-BY |
49 |
17,1 |
31.677 |
11,0% |
CC-BY-NC-ND |
9 |
3,1 |
7.828 |
2,72% |
Total |
287 |
100 |
287.293 |
100,0% |
A perspectiva do Programa SciELO é alcançar a adoção da licença CC-BY por mais de 90% dos periódicos da coleção SciELO Brasil já a partir de 2016.
Referências
Berlin Declaration on Open Access to Knowledge in the Sciences and Humanities. Openaccess. 2003. Available from: http://openaccess.mpg.de/Berlin-Declaration
Bethesda Statement on Open Access Publishing. Digital Access to Scholarship at Harvard (DASH). 2003. Available from: http://dash.harvard.edu/bitstream/handle/1/4725199/suber_bethesda.htm?sequence=1
CARROLL, M.W. Why Full Open Access Matters. PLoS Biol. 2011, vol. 9 nº 11: e1001210. DOI: 10.1371/journal.pbio.1001210
Critérios SciELO Brasil: critérios, políticas e procedimentos para admissão e permanência de periódicos científicos na Coleção SciELO Brasil. SciELO Brasil. 2014. Available from: http://www.scielo.br/avaliacao/20141003NovosCriterios_SciELO_Brasil.pdf
Frequently Asked Questions. Licensing. Open Access Scholarly Publishers Association (OASPA). Available from: http://oaspa.org/information-resources/frequently-asked-questions/#FAQ5
Read the Budapest Open Access Initiative. Budapest Open Access Initiative. 2002. Available from: http://www.budapestopenaccessinitiative.org/read
Salvador Declaration on Open Access: The Developing World Perspective. International Seminar Open Access for Developing Countries (icml9). 2005. Available from: http://www.icml9.org/meetings/openaccess/public/documents/declaration.htm
Link Externo
Creative Commons – <http://creativecommons.org/>
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