Por Dr. Francisco Osorio (fosorio@u.uchile.cl), Editor do periódico Cinta de Moebio.
A Open Library of Humanities (openlibhums.org) não é mais um projeto. No dia 28 de setembro de 2015 o mega-journal de humanidades e ciências sociais foi lançado e, com ele, um novo modelo de financiamento.
Desafios para periódicos da América Latina e o SciELO
O conceito de mega-journal começou nas ciências naturais, mas agora temos um em humanidades e ciências sociais. Na América Latina, que eu saiba, não estamos caminhando nessa direção, mas criando novos periódicos o tempo todo. A língua não será um problema porque The Open Library of Humanities está disposto a publicar artigos em espanhol e português. Uma questão importante é se devemos nos juntar a eles.
Abro a discussão sobre este tema apresentando alguns argumentos nas seções a seguir. Minha opinião é que esta proposta nos desafia de muitas maneiras. Do ponto de vista da reivindicação de acesso aberto, não vejo algo novo. Temos percorrido este caminho há muito tempo e não há nenhum sinal de que coisas vão mudar no futuro próximo. Muito pelo contrário, é o mundo editorial em inglês que está tentando fugir do modelo tradicional. O que é interessante observar é sua proposta de financiamento, como eles trabalham com bibliotecas de vários países, como continuam a discutir o acesso aberto e como vai funcionar o primeiro mega-journal em humanidades.
A questão é que novas formas de comunicar pesquisas estão surgindo e é precisamente este o nosso interesse nesta conversa sobre um mega-journal em humanidades. Além do desafio que representa para periódicos individuais, o SciELO, que foi pioneiro na publicação online em acesso aberto, pode provocar esta discussão em direção à convergência de vários periódicos atuais para operar como um mega-journal. Em outras palavras, nós podemos fazê-lo, por isso vamos dedicar esta proposta e falar sobre isso.
Quatro modelos para periódicos de acesso aberto
Da forma como conhecemos, os modelos de financiamento para periódicos acadêmicos são: (a) o leitor paga, (b) o autor paga e (c) ninguém paga. O novo modelo do Open Library of Humanities é que (d) as bibliotecas pagam. Os modelos (a) e (b) são bastante familiares para estudantes e professores. Está fundamentado em cobrar uma das extremidades do espectro: ou o criador paga antecipadamente ou o usuário final o faz. O modelo (c) é comum em periódicos de acesso aberto na América Latina, pois ou o autor paga aos periódicos para publicar ou o leitor é cobrado para acessar o conteúdo no qual está interessado. Mas a frase ‘ninguém paga’ é enganosa. O custo de funcionamento do periódico é absorvido por alguém: o próprio bolso do editor, o centro de pesquisa, a universidade, uma empresa privada ou mesmo o Estado.
Tendo isso em mente, a Open Library of Humanities surgiu com uma proposta diferente: cobrar as bibliotecas. O periódico é definido como um modelo de financiamento coletivo. Quando a proposta veio à tona em 2013, foi baseada na seguinte suposição: Considere um periódico que publica 250 artigos por ano – se 100 bibliotecas fossem envolvidas, cada biblioteca deveria contribuir US$ 1.850,00 de forma que o custo do artigo por instituição seria de US$ 7,40. Se 400 bibliotecas fossem envolvidas, a sua contribuição seria de US$ 462,00 e o custo por artigo cairia para US$ 1,84.
No dia do lançamento 99 bibliotecas estavam envolvidas. Por bibliotecas se entende aquelas ligadas a universidades do Reino Unido (principalmente), universidades americanas, algumas canadense, algumas europeias, uma universidade australiana e algumas organizações privadas. Em 2015, a Open Library of Humanities vai considerar a publicação de 150 artigos por ano ao custo de US$ 6 por biblioteca.
Então, seria o modelo (d) – as bibliotecas pagam – diferente do modelo (c) – ninguém paga? Em certo sentido, a opção ‘as bibliotecas pagam’ se enquadra na categoria ‘ninguém paga’ pois o custo é absorvido por uma universidade, de acordo com a experiência de acesso aberto na América Latina. A diferença pode ser encontrada em sua abordagem coletiva. Que eu saiba, não há 100 universidades Latino-Americanas que contribuam financeiramente para um único periódico acadêmico em humanidades e ciências sociais.
O periódico como plataforma
Como periódico, o Open Library of Humanities publicou um artigo no seu primeiro dia – Reino Unido 3D? A História e os Pioneiros Britânicos Ausentes (3D UK? 3D History and the Absent British Pioneers) por Keith Johnston e um editorial da autoria de seus criadores (Eve & Edwards 2015). O chileno Manuel Tapia – ou mais precisamente Manuel Loyola Tapia (‘Loyola Tapia’ é o sobrenome usual na estrutura de nomeação espanhola) é o único Latino-Americano na equipe como editor de seção de estudos culturais e teoria crítica.
Como uma plataforma, há sete periódicos até agora sob o protocolo (se bem entendi, os 150 artigos a ser publicadas serão distribuídos entre estes sete periódicos). Em outras palavras, é uma plataforma econômica, social e tecnológica para uma transição ao acesso aberto. Mais uma vez, os periódicos Latino-Americanos que já estão em acesso aberto devem se perguntar o que podem ganhar juntando-se a Open Library of Humanities como uma plataforma.
Cordiais boas vindas
Eu realmente gosto desta proposta, porque o cerne da questão é o tema das formas de comunicação em humanidades e ciências sociais como distintas das ciências naturais. Em 2015, a recém-formada Associação de Periódicos Culturais e Literários da América Latina (chamada Latinoamericana, com 106 periódicos, liderada pelo editor de periódico venezuelano Jeffrey Cedeño), fez a pergunta: Poderiam os periódicos se auto intitular científicos? Curiosamente, havia algumas opiniões fortemente favor, e não porque o trabalho se assemelha às ciências naturais, mas porque o conceito de ciência ajuda a explicar para o governo como ele é realizado: com pensamento sério e importante. Também em 2015, um comunicado assinado naquela época por 92 periódicos e publicado no periódico Poiesis (N° 29) denominado ‘Uma declaração sobre a avaliação da qualidade acadêmica em periódicos de humanidades’1, argumentou contra (a) importância global de métricas e indicadores em vez de conteúdo e valor em artigos e periódicos em humanidades; e (b) o negligenciamento das diferenças entre as práticas em humanidades em comparação com as ciências naturais. Isso levou a um protocolo com cinco diretrizes:
Não promova um artigo por causa de seu Fator de Impacto
Não use a estrutura de artigo IMRAD como uma obrigação
Não considere um periódico sem Fator de Impacto como menos valioso
Não feche o acesso à leitura de um periódico
Não cobre os autores para publicação
Finalmente, apoio o debate sobre a publicação acadêmica na era da Internet. Nossas práticas de fato estão mudando e às vezes é difícil entender para onde estamos indo. A questão das formas de comunicação em humanidades permanece e talvez esta seja uma lição simples, mas importante, das ciências sociais: abra o debate e compare outras práticas em um diálogo universal.
Notas
1. Declaración sobre la medición de la calidad académica de las publicaciones propias de las humanidades. Poiesis. 2015, vol. 29, pp. 1-7. Available from: http://www.funlam.edu.co/periódicos/index.php/poiesis/article/view/1607
2. Esta versão é baseada no post no blog The Impact Factor publicado em 30 de setembro de 2015 pelo autor, sob Licença Creative Common: http://blogs.lse.ac.uk/impactofsocialsciences/2015/09/30/publishing-model-of-the-open-library-of-humanities/
Referências
Declaración sobre la medición de la calidad académica de las publicaciones propias de las humanidades. Poiesis. 2015, vol. 29, pp. 1-7. Available from: http://www.funlam.edu.co/periódicos/index.php/poiesis/article/view/1607
EVE, M.P. and EDWARDS, C. Opening the Open Library of Humanities. Open Library of Humanities. 2015, vol. 1, nº 1, pp. e1. DOI: 10.16995/olh.46
OSORIO, F. Exploring the publishing model of the Open Library of Humanities: A view from Latin America. The Impact Factor Blog. Available from: http://blogs.lse.ac.uk/impactofsocialsciences/2015/09/30/publishing-model-of-the-open-library-of-humanities/
Como citar este post [ISO 690/2010]:
Leia o comentário em espanhol, por Manuel Loyola:
http://blog.scielo.org/es/2015/10/07/la-propuesta-editorial-de-la-biblioteca-abierta-de-humanidades-publicado-originalmente-en-el-blog-the-impact-factor/#comment-35437