O que está atrasando a transição ao acesso aberto se não custa mais?

Por Jan Velterop

open_accessÉ mais do que claro que há dinheiro suficiente no sistema de publicação científica para fazer a transição do modelo por assinaturas (acesso fechado) ao acesso aberto por meio da taxa de processamento de artigo (Article Processing Charge, APC). Um post recente neste blog1 aborda especificamente a questão, ao comentar um estudo2 atual da Max Planck Society.

Então porque isso não está acontecendo?

Não é porque os encargos financeiros mudariam dramaticamente, mesmo que os custos totais permanecessem os mesmos. Pior, mesmo que o total fosse materialmente menor. Isto é devido ao fato de que as necessidades de aquisição de periódicos de uma instituição raramente são as mesmas que suas necessidades de publicação em periódicos. Abaixo, dois exemplos para ilustrar este fato, um pagando mais, e outro, com diminuição de custos:

  • Pagar mais em um mundo de acesso aberto financiado por APCs: Uma instituição com muitos pesquisadores, mas centrada em um pequeno número de (sub) disciplinas (imagine o CERN, por exemplo, em Genebra, Suíça). O número de periódicos que eles teriam que ter é relativamente pequeno, da mesma forma que sua conta de assinaturas. O número de cientistas que publicam, no entanto, é grande, assim como seria grande o gasto com APCs – supondo que todos seriam publicados em periódicos de acesso aberto financiadas por APC. A conta de APC pode facilmente ser maior do que a conta de assinaturas, mesmo se as APCs fossem modestas, por isso a instituição em questão pode, ao menos financeiramente, piorar se eles escolherem uma política de acesso aberto.
  • Pagar menos em um mundo de acesso aberto financiado por APCs: Uma instituição com um forte enfoque educacional (no aluno) em oposição a um enfoque em pesquisa. Se toda ou a maioria da literatura é de acesso aberto, a sua fatura da biblioteca irá diminuir, já que não há mais assinaturas a pagar.

Estes dois exemplos são extremos opostos do espectro, mas é bastante claro que, para a maioria das instituições, a ideia de uma transição direta de pagar por assinaturas para pagar APCs está longe de ser um exercício orçamentário neutro e, portanto, na prática, um obstáculo intransponível para muitos.

Transições muitas vezes custam mais dinheiro durante o período de transição, mas o problema com o sistema de publicação científica é que essa transição – e os custos extras – pode demorar bastante tempo. Não existe, então, nada a ser feito sobre isso? Talvez haja. Instituições individuais podem não ser capazes de fazer a transição direta, por causa de diferenças entre suas necessidades de acesso a periódicos e suas necessidades de publicação de artigos em periódicos. Estas diferenças, no entanto, são muito menores, e podem até não ser significativas se olharmos para a escala de um país (ou região, ou estado, em grandes países). Nesse nível, a probabilidade é que as necessidades de acesso a periódicos e de publicação se equilibrem mutuamente.

O meu apelo é para que se explore o potencial de acordos de larga escala de acesso aberto. A abordagem da Sociedade Max Planck2 é uma delas, e também a das universidades holandesas, unificadas na Associação das Universidades dos Países Baixos (VSNU)3, que estão se movendo em direções interessantes a este respeito, fortemente apoiadas pelo governo holandês. Considero que suas chances de sucesso são altas. Vale a pena, definitivamente, acompanhar o seu progresso.

Notas

1. COP, N. Recursos gastos globalmente em assinaturas de periódicos podem ser completamente transferidos para um modelo de negócio de acesso aberto para liberar acesso aos periódicos?. SciELO em Perspectiva. [viewed 10 September 2015]. Available from: https://blog.scielo.org/blog/2015/05/26/recursos-gastos-globalmente-em-assinaturas-de-periodicos-podem-ser-completamente-transferidos-para-um-modelo-de-negocio-de-acesso-aberto-para-liberar-acesso-aos-periodicos/

2. SCHIMMER, R., GESCHUHN, K.K., and VOGLER, A. Disrupting the subscription journals’ business model for the necessary large-scale transformation to open access. MPG. PuRe. 2015. DOI: 10.17617/1.3.

3. JUMP, P. Elsevier journal editors ‘may be asked to resign’ in open access row. The Word University Rankings, July 3,2015. Available from: https://www.timeshighereducation.co.uk/news/elsevier-journal-editors-%E2%80%98may-be-asked-resign%E2%80%99-open-access-row

Referência

COP, N. Recursos gastos globalmente em assinaturas de periódicos podem ser completamente transferidos para um modelo de negócio de acesso aberto para liberar acesso aos periódicos?. SciELO em Perspectiva. [viewed 08 September 2015]. Available from: https://blog.scielo.org/blog/2015/05/26/recursos-gastos-globalmente-em-assinaturas-de-periodicos-podem-ser-completamente-transferidos-para-um-modelo-de-negocio-de-acesso-aberto-para-liberar-acesso-aos-periodicos/

Links externos

Max Planck Society: http://www.mpg.de/en

Association of Universities in the Netherlands (VSNU): http://www.vsnu.nl/en_GB

 

Sobre Jan Velterop

Jan Velterop (1949), geofísico marinho, tornou-se editor científico em meados dos anos 1970. Ele iniciou sua carreira como editor na Elsevier em Amsterdã. Em 1990 tornou-se diretor de um jornal holandês, mas retornou à publicação científica internacional em 1993 na Academic Press em Londres, onde desenvolveu o primeiro acordo nacional que permitiu acesso eletrônico a todos os periódicos AP por todas as instituições de ensino superior do Reino Unido (o que mais tarde foi denominado BigDeal). Ele foi Diretor na Nature, mas logo se dedicou para ajudar a fazer decolar o BioMed Central. Ele participou da Iniciativa de Budapeste para o Acesso Aberto. Em 2005 foi para a Springer, baseado no Reino Unido como Diretor de Acesso Aberto. Em 2008 ele deixa a Springer para apoiar o desenvolvimento de abordagens semânticas para acelerar descobertas científicas. Velterop é um ativo defensor do acesso aberto em conformidade com a Iniciativa de Acesso Aberto de Budapeste (BOAI) e do uso de microatribuições, a referência das denominadas “nanopublicações”. Ele publicou vários artigos sobre ambos os temas.

 

Como citar este post [ISO 690/2010]:

VELTEROP, J. O que está atrasando a transição ao acesso aberto se não custa mais? [online]. SciELO em Perspectiva, 2015 [viewed ]. Available from: https://blog.scielo.org/blog/2015/09/10/o-que-esta-atrasando-a-transicao-ao-acesso-aberto-se-nao-custa-mais/

 

2 Thoughts on “O que está atrasando a transição ao acesso aberto se não custa mais?

  1. Leticia Freire on September 16, 2015 at 11:47 said:

    Honestamente?? O open access está de acordo com valores democráticos de difusão de conhecimento, e num mundo onde tudo é “custo”, tudo é “gasto”, tudo é “pib”, deveríamos pensar melhor sobre quem ganha e quem perde com a mercantilização da informação. Jan Velterop com certeza não representa os editores e cientistas nacionais.

  2. Pingback: Periódicos UFMG | Artigos discutem modelo de publicação em acesso aberto para periódicos científicos

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