Jeffrey Beall e as listas negras

Por Hooman Momen

Foto adaptada da original: KatLevPhoto.

Foto adaptada da original: KatLevPhoto.

Jeffrey Beall é provavelmente mais conhecido por sua lista de editoras acadêmicas de acesso aberto predatórias. A lista parece fornecer um serviço útil à comunidade acadêmica em alertar pesquisadores a respeito de publicações questionáveis. No entanto, existem dois problemas principais com esta lista.

  1. A lista é baseada em opiniões e julgamentos de uma única pessoa e, portanto, sujeita a erros de julgamento, preconceitos e conflitos de interesse inerentes a tal abordagem;
  2. A lista inclui apenas periódicos de acesso aberto, dando a impressão de que somente este modelo de publicação está sujeito a práticas predatórias e questionáveis.

As razões para o aumento de práticas questionáveis ​​de publicação são complexas e fora do escopo deste blog, porém incluem a hipercompetitividade atual na ciência, o aumento dramático no número de pesquisadores, muitas vezes mal treinados sobre ética em pesquisa e publicação, e o uso de artigos de periódicos como “moeda” para decidir sobre promoção, estabilidade na carreira, contratação ou concessão de auxílio à pesquisa. Estes fatores em conjunto com atributos humanos de ingenuidade, vaidade e ganância, fornecem o ambiente no qual florescem periódicos predatórios.

É certamente verdade que o problema das publicações questionáveis ​​ocorre com mais frequência com periódicos de acesso aberto, mas isso não é inerente a este modelo de publicação. A maioria das editoras, incluindo as principais editoras comerciais, descobriu que o acesso aberto fornece um modelo econômico vantajoso para a publicação de novos periódicos. O resultado é que quase todos os novos periódicos utilizam o modelo de acesso aberto e práticas predatórias de publicação ocorrem muitas vezes (mas não exclusivamente) em novos periódicos.

Mesmo que o modelo de acesso aberto fosse abolido o fenômeno dos periódicos predatórios não seria eliminado. Aqueles por trás destas empresas encontrariam novas maneiras de servir a este mercado. Editoras que operam com assinaturas também produzem periódicos questionáveis, incluindo algumas das principais editoras comerciais. Existe também uma rede de editoras não-acesso aberto pretensiosas, dispostas a publicar qualquer dissertação ou tese como uma monografia acadêmica.

Mas voltemos à lista do Sr. Beall, um artigo que ele publicou recentemente deixa claro que seu ataque a periódicos de acesso aberto é, na verdade, baseado em seu desagrado profundo pelo movimento de acesso aberto em geral, que ele acredita ser uma conspiração liderada por socialistas europeus destinada a destruir a publicação com fins lucrativos. O Sr. Beall é particularmente crítico da via dourada de acesso aberto, afirmando que “Acadêmicos nunca deveriam ter permitido um sistema que requer transações monetárias entre autores e editores”, mas parece não ter problema com periódicos por assinatura que cobram taxas de publicação, um caso claro de padrão duplo.

O Sr. Beall também parece ter uma profunda desconfiança de publicações acadêmicas do mundo em desenvolvimento. Ele coloca regularmente novas editoras destes países em sua lista até que estas possam “provar” suas credenciais, criando dificuldades adicionais para as editoras destes países. Um caso em questão é sobre a MedKnow, uma editora de periódicos conceituados no Oriente Médio e Ásia, incluindo o periódico de um escritório regional da Organização Mundial da Saúde. Esta editora foi adicionada à sua lista de observação, presumivelmente por estar baseada na Índia. A editora foi então adquirida pela Walters-Kluwer e os periódicos de repente se tornaram seguros na visão de mundo de Beall, e a editora desapareceu da lista de observação.

Esta combinação de aversão a publicação de acesso aberto e desconfiança da publicação acadêmica no mundo em desenvolvimento resultou agora, em seu blog, na comparação da plataforma SciELO com uma favela. Os leitores deste blog não precisam que eu descreva os serviços proeminentes prestados por SciELO para a publicação acadêmica, nem o absurdo de seus argumentos, contudo, você pode encontrar mais detalhes em meus comentários e respostas postados em seu blog original1, que fornece evidência adicional de seus preconceitos e motivações.

As listas negras, particularmente aquelas criadas sem o devido processo, são moralmente perigosas e já é tempo da lista de Beall ser substituída por uma lista de periódicos conceituados. Periódicos predatórios são apenas um problema em um ambiente de publicação cada vez mais eticamente desafiador, especialmente para pesquisadores inexperientes. A nova lista deveria ser impessoal, amplamente disponível para consulta, apoiada por organizações acadêmicas e com critérios de exclusão e inclusão transparentes, mas isso é assunto para outro post…

Nota

1. BEALL, J. Is SciELO a Publication Favela? Scholarly Open Access. 2015. Available from: http://scholarlyoa.com/2015/07/30/is-scielo-a-publication-favela/

Referências

BEALL, J. Is SciELO a Publication Favela? Scholarly Open Access. 2015. Available from: http://scholarlyoa.com/2015/07/30/is-scielo-a-publication-favela/

BEALL, J. List of publishers. Scholarly Open Access. 2015. Available from: http://scholarlyoa.com/publishers/

BEALL, J. The Open-Access Movement is Not Really about Open Access. tripleC. 2013, vol. 11, nº 2, pp. 589–597. Available from: http://triplec.at/index.php/tripleC/article/view/525/514

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Hooman Momen

 

Como citar este post [ISO 690/2010]:

MOMEN, H. Jeffrey Beall e as listas negras [online]. SciELO em Perspectiva, 2015 [viewed ]. Available from: https://blog.scielo.org/blog/2015/08/04/jeffrey-beall-e-as-listas-negras/

 

One Thought on “Jeffrey Beall e as listas negras

  1. Pingback: E a grita contra Jeffrey Beall continua. Os editores predatórios agradecem! | Blog do Pedlowski

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